terça-feira, 9 de junho de 2009

Chotiça


A schottische é considerada pelo Oxford Companion to Music uma espécie de polca mais lenta, de origem continental, que não deve ser confundida com a escocesa. Trata-se de uma dança circular que entrou em Inglaterra nos meados do século XIX (justamente a época do furor da polca), com o nome de «polca alemã». Os autores de Traditional Dancing in Scotland, J. F. e T. M. Flett, são da mesma opinião, tratando-a como uma dança circular sucessora da polca.
Curt Sachs revela que o esquema coreográfico da polca, quando esta dança se consagrou e definiu, não apresentava nada de verdadeiramente novo: combinava o antigo fleuret com o pas de bourrée e com a escocesa, então muito comum. Por isso, quando fez aparição na Alemanha, tomou aí o nome de schottische. Temos assim que a schottische será efectivamente uma espécie de polca, de que conserva aliás o compasso binário.
Silvério da Silva, tocando palheta. Maxial, Torres Vedras, 1988.
Para se avaliar da rápida expansão desta dança, como aliás de todas as danças europeias de salão do século passado, lembre-se que em 1851 já se dançava a schotisch no Rio de Janeiro. Também em Portugal esta dança de origem europeia se difundiu rapidamente, talvez mesmo mais do que a própria polca. No Manual de Dança ou Méthodo Fácil de Aprender a Dançar sem Auxílio de Mestre, editado em Lisboa, constata-se a sua aceitação na alta sociedade: «A schottisch, assim como a polka, tem grande voga nos salões dançantes do grande tom». Tal como muitas outras danças de salão, foi adoptada pelo nosso povo, que a assimilou e adaptou ao seu ethos.A evolução fonética da palavra inicial originou, junto do povo português, as variantes terminológicas chotiça, checote, chicote (e às vezes até chacota, decerto por sobrevivência terminológica da antiga dança medieval), nomes por que é conhecida a schottische nas províncias em que é dançada, sobretudo no Ribatejo, Algarve, Alentejo e Estremadura. Aqui gravámos nós vinte e três exemplares, nos concelhos de Sintra, Mafra, Torres Vedras, Cadaval e Lourinhã. O espécime que reduzimos à solfa, de melodia singela mas graciosa, tem de especial ser interpretado à palheta, rude instrumento feito de caniços, a que adiante faremos referência.No Seixal da Lourinhã era uma «moda muito puladinha!», que «toda a gente daquele tempo queria bailar». Os pares, em número de quatro, seis ou oito, formam em roda e bailam agarrados. A roda começa a girar e, a certa altura, os pares «passam», isto é, os pares que estão nos pontos opostos trocam de lugar entre si cruzando-se no centro da roda. Vão «passando», sucessivamente e de dois em dois, todos os pares, após o que continuam a bailar em roda. Mais adiante, vão todos os pares ao centro «rebater» (i. e. bater os pés ao centro) e voltam aos seus lugares recomeçando a bailar em roda, sempre para o lado direito. Note-se que todas estas movimentações são sempre feitas pelo par e nunca pelos seus elementos isoladamente, pois «no checote nunca se troca de par». No Seixal, bailar o checote «era uma coisa linda de se ver». Deixou de ser bailado há cerca de vinte anos (informação de 1984) e hoje em dia já ninguém da mocidade sabe dançá-lo.Em Mação, nos fins do século XIX, também se dançava a schotice, que era uma «dança de ir ao meio» – Francisco Serrano, Viagem à Roda de Mação, p. 79. Embora o autor nada mais adiante, é de realçar a característica de ir ao meio, idêntica à que descrevemos na Estremadura. Também Tomaz Ribas refere que, no Ribatejo, a chotiça é bailada «ao centro, com jeitinho».De salientar ainda o uso da chotiça na Lisboa oitocentista. Segundo relato de Júlio César Machado, havia um grupo de músicos populares, de que adiante melhor falaremos, que costumava percorrer a capital anunciando eventos de relevo, como touradas, o qual tocava nomeadamente «polkas e xótiças».

in http://www.attambur.com/Recolhas/Estremadura/Dancas/chotica.htm

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